Destaques Gerais

  • A castanha-do-brasil é um produto estratégico da sociobiodiversidade amazônica.

  • Representa fonte de renda para milhares de famílias extrativistas.

  • Enfrenta desafios estruturais, como dependência de atravessadores e falta de políticas públicas.

  • Seu alto teor de selênio a torna importante para a saúde humana.

  • Políticas locais, como no Acre, mostram caminhos viáveis de valorização produtiva.


🧪 Estudos com Detalhes

1. Cadeia Produtiva na Calha Norte (Pará)

📄 Krag & Santana (2017)
🔍 Análise sistêmica com metodologia ValueLinks
📍 Local: Óbidos e Oriximiná (PA)
🧩 Problemas:

  • Intermediários lucram mais que extrativistas

  • Armazenamento e logística precários

  • Baixo preço recebido pelos coletores
    🔗 Potenciais:

  • Fortalecer cooperativas

  • Agregar valor com beneficiamento local

  • Ampliar políticas públicas e técnicas de manejo


2. História e Perspectivas da Castanha

📄 Almeida (2015)
📚 Tese da USP sobre a transição do extrativismo à domesticação
🎯 Enfoque histórico, político, botânico e comercial
⚖️ Conflito:

  • Visão excludente entre cultivo e coleta

  • Falta de incentivos públicos para industrialização
    🛤 Caminho proposto:

  • Integração entre extrativismo sustentável e cultivo racional

  • Mais tecnologia, consumo interno e certificações


3. Efeitos na Saúde Humana

📄 Godos et al. (2022)
📌 Revisão sistemática e meta-análise (8 estudos)
💊 Avaliado:

  • Selênio no sangue ↑

  • Atividade antioxidante ↑

  • Colesterol e inflamação ↔ (sem alteração significativa)
    ✅ Conclusão:

  • A castanha melhora o status de selênio e a ação antioxidante (via GPx), mas não há efeito claro em lipídios ou inflamação


4. Experiência do Acre

📄 Bayma et al. (2014)
🏭 Ações públicas estruturaram a cadeia produtiva
🏆 Sucesso da COOPERACRE como modelo organizacional
💰 Impacto:

  • Acréscimo de valor com beneficiamento local

  • Aumento de exportações e diversificação de produtos (óleo, farinha, biscoitos)
    🧩 Desafio:

  • Ainda é necessário fortalecer indústrias e remuneração justa


5. Viabilidade Econômica no Baixo Amazonas

📄 Silva et al. (2013)
📈 Estudo econômico em 3 municípios (Oriximiná, Óbidos, Almeirim)
💸 Renda familiar significativa (até 18%) com castanha
👨‍👩‍👧‍👦 Atividade majoritariamente com mão de obra familiar
🧩 Desafio:

  • Atravessadores ainda dominam

  • Falta política pública, transporte e armazenamento adequado


6. Comunidades de Tefé (AM)

📄 Silva et al. (2019)
📍 Estudo em 4 comunidades
🚧 Problemas:

  • Jovens abandonam a atividade

  • Baixa escolaridade

  • Falta de acesso à terra e políticas públicas
    💡 Soluções propostas:

  • Agregar valor localmente

  • Atrair jovens com melhores condições

  • Estimular organização social e acesso ao crédito


7. Análise Econômica com Oferta e Demanda (AM)

📄 Luciane Silva, INPA (2015)
📉 A produção de castanha é inelástica ao preço
🔄 Mesmo com aumento de preço, produção não cresce proporcionalmente
💸 Renda das famílias depende da castanha, mas não é suficiente
🔧 Propostas:

  • Fortalecer cooperativas como a COVEMA

  • Adotar inovação social e novos arranjos de mercado


8. Teor de Selênio nas Castanhas (Meta-análise Embrapa)

📄 Freitas et al. (2008)
📊 Alta variação natural no teor de selênio
💥 Riscos:

  • 5% das castanhas analisadas tinham mais do que o limite seguro diário

  • 25% tinham menos que o mínimo necessário
    🛑 Recomendação:

  • Monitoramento constante

  • Rotulagem clara para segurança alimentar


9. Castanha como Suplemento Natural (Nova Zelândia)

📄 Thomson et al. (2008)
🧫 Estudo clínico: 2 castanhas/dia aumentaram o selênio plasmático
⚖️ Eficácia comparável à de suplemento artificial de selênio
✅ Aumento da atividade da enzima antioxidante (GPx)
⚠️ Observação:

  • A variação no teor de selênio entre castanhas exige moderação no consumo


✅ Conclusão Geral

A castanha-do-brasil é um produto central para a economia, saúde e sustentabilidade da Amazônia. Ela representa:

  • Uma fonte alimentar funcional e rica em selênio;

  • Um recurso natural com potencial de geração de renda;

  • Uma alternativa viável de desenvolvimento sustentável.

No entanto, a cadeia produtiva ainda é marcada por desigualdades: os extrativistas, principais responsáveis pela preservação do recurso, seguem como o elo mais frágil.

Para que esse quadro mude, os estudos apontam caminhos convergentes:

  • Fortalecer cooperativas e associações;

  • Melhorar políticas públicas de incentivo;

  • Ampliar a agregação de valor nos territórios produtores;

  • Controlar e padronizar a composição nutricional dos produtos.

 

Com ações coordenadas entre poder público, sociedade civil e instituições de pesquisa, a castanha-do-brasil pode ser consolidada como um símbolo de desenvolvimento justo e conservação da floresta.

 

 

 

 



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O artigo “A cadeia produtiva da castanha-do-brasil na região da Calha Norte, Pará, Brasil”, de autoria de Márcia Nágem Krag e Antônio Cordeiro de Santana, é uma análise sistêmica aprofundada da cadeia produtiva da castanha-do-brasil (também chamada castanha-do-pará) na região da Calha Norte do Pará, um importante território de produção extrativista da Amazônia. Com base na metodologia ValueLinks, o estudo mapeia as estruturas, vínculos comerciais, atores envolvidos, gargalos e potencialidades dessa cadeia, destacando a importância do fortalecimento das comunidades locais, em especial os quilombolas, que são a base dessa produção, mas que recebem a menor fatia de valor agregado.

O trabalho vai além de uma descrição linear e busca entender as dinâmicas econômicas, sociais e institucionais que moldam essa cadeia de valor, oferecendo uma visão crítica e propositiva sobre como melhorar a organização, a governança e a sustentabilidade do setor.

Contexto e importância da castanha-do-brasil

A castanha-do-brasil é um dos principais produtos florestais não madeireiros da Amazônia, com destaque na pauta de exportações e no fornecimento de renda para populações tradicionais e quilombolas. Na região da Calha Norte, essa atividade extrativista tem papel central na economia local, contribuindo também para a conservação ambiental. A região engloba nove municípios e mais de 28 milhões de hectares, incluindo terras quilombolas e áreas de proteção ambiental.

Objetivo do estudo

Analisar a cadeia produtiva da castanha-do-brasil de forma sistêmica, utilizando a metodologia ValueLinks, a fim de compreender a estrutura da cadeia, suas fragilidades, seus elos de comercialização e propor estratégias para fortalecer o arranjo produtivo, com foco no desenvolvimento local e na valorização da sociobiodiversidade amazônica.

Métodos

A pesquisa é qualitativa, do tipo estudo de caso, com foco nos municípios de Óbidos e Oriximiná. Os dados foram coletados em 2014, por meio de 30 entrevistas com três perfis de agentes sociais:

1.    Extrativistas/coletores;

2.    Intermediários (atravessadores);

3.    Proprietários de agroindústrias beneficiadoras de castanha.

Foi aplicada a técnica snowball para selecionar os entrevistados e usada a metodologia ValueLinks, que permite mapear a cadeia desde a produção até a comercialização, considerando também as relações institucionais e organizacionais.

Principais resultados

1. Estrutura da cadeia e seus fluxos

·         A cadeia começa com os extrativistas, geralmente famílias quilombolas que coletam as castanhas em áreas florestais.

·         A produção é vendida a intermediários ou cooperativas, que repassam às indústrias de beneficiamento.

·         As indústrias, em sua maioria instaladas em Óbidos e Oriximiná, realizam o processamento e vendem para o mercado interno e externo.

As agroindústrias são o elo central da cadeia: determinam preços, controlam os fluxos e ditam as regras do mercado.

2. Problemas enfrentados pelos extrativistas

·         Acesso difícil aos castanhais (até 3 dias de viagem fluvial);

·         Insalubridade no trabalho (quedas de ouriços, mordidas de cobras);

·         Falta de transporte e infraestrutura;

·         Armazenamento precário;

·         Baixa valorização do produto (preços pagos muitas vezes abaixo do mínimo da CONAB);

·         Ausência de incentivos para adoção de boas práticas.

A média de produtividade é de 10 caixas por árvore e um trabalhador coleta de 50 a 60 kg por dia.

3. Papel das cooperativas e associações

·         CEQMO (Cooperativa Mista dos Quilombolas de Oriximiná) é a principal organização local.

·         Atua em áreas tituladas e não tituladas de territórios quilombolas.

·         Viabiliza negociações mais justas, mas enfrenta resistência por parte de alguns extrativistas devido à burocracia e exigências.

4. Intermediários e comercialização

·         Atravessadores ainda são comuns, lucrando até 40% a mais do que os coletores.

·         Utilizam medidas imprecisas (como caixas de 42 L em vez de 40 L), o que causa prejuízo aos extrativistas.

·         Em muitos casos, são a única opção para comunidades isoladas.

5. Indústrias de beneficiamento

·         São três empresas, com até 120 funcionários, operando com matéria-prima extrativista.

·         As etapas do processamento incluem recepção, limpeza, quebra, secagem, polimento e embalagem.

·         Adotam certificações ISO, orgânica, Halal, Kocher etc., mas enfrentam dificuldades com:

o   Barreiras sanitárias (aflatoxinas);

o   Burocracias;

o   Sazonalidade da produção.

O rendimento médio é de 15 kg de castanha sem casca para cada 50 kg com casca. Isso significa uma valorização do produto em até 3,87 vezes após o beneficiamento.

6. Preços ao longo da cadeia

·         Preço médio pago ao extrativista em 2014: R$ 1,00 a R$ 1,25/kg.

·         Intermediário vende para a indústria: R$ 1,75/kg.

·         Indústria vende para exportação: até R$ 20,00/kg.

·         Vantagem clara para os extrativistas que vendem por cooperativas, que conseguem até R$ 3,20/kg.

Gestão de cadeia: Diagnóstico e proposta

Problemas

·         Falta de planejamento territorial;

·         Baixa capacitação dos atores;

·         Deficiência na governança da cadeia;

·         Oscilação de preços e dependência do mercado externo.

Gargalos

·         Logística precária;

·         Desmatamento e invasões em áreas quilombolas;

·         Falta de políticas públicas integradas.

Potencialidades

·         Preservação ambiental natural da atividade;

·         Existência de conhecimento tradicional;

·         Presença de indústrias locais e canais de escoamento.

Oportunidades

·         Parcerias com universidades e ONGs;

·         Implementação de boas práticas de manejo;

·         Plantio de castanheiras para reverter o envelhecimento dos castanhais;

·         Verticalização da cadeia com valorização local.

Considerações finais

O estudo evidencia que o elo extrativista permanece como o menos valorizado, apesar de ser o principal responsável pela manutenção da floresta e pela sustentabilidade do recurso. A falta de uma visão sistêmica entre os elos compromete o desenvolvimento da cadeia. No entanto, há boas perspectivas de fortalecimento local se forem criadas políticas públicas integradas, ampliada a assistência técnica, estimuladas as associações e cooperativas, e adotadas boas práticas de manejo e beneficiamento.

O artigo conclui que a castanha-do-brasil tem alto potencial de se consolidar como um produto estratégico da sociobiodiversidade amazônica, desde que haja investimento contínuo em todos os níveis da cadeia produtiva.

Referência:

KRAG, Márcia Nágem; SANTANA, Antônio Cordeiro de. A cadeia produtiva da castanha-do-brasil na região da Calha Norte, Pará, Brasil. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Naturais, Belém, v. 12, n. 3, p. 363-386, set./dez. 2017. Disponível em: https://doi.org/10.46357/bcnaturais.v12i3.1665. Acesso em: 11 abr. 2025.

 

 
 

 

 

 

A tese intitulada “Do extrativismo à domesticação: as possibilidades da castanha-do-pará”, de José Jonas Almeida, defendida na Universidade de São Paulo (USP) em 2015, trata da trajetória histórica, econômica e técnica da castanha-do-pará, desde sua exploração extrativista até as tentativas de cultivo racional e aproveitamento industrial. O autor realiza uma ampla análise que envolve aspectos botânicos, ecológicos, socioeconômicos e políticos, com destaque para os impactos das políticas públicas na Amazônia e o papel das instituições científicas na tentativa de transformar um recurso tradicionalmente extrativista em alternativa agrícola sustentável.

Ao longo do trabalho, Almeida também discute as tensões entre extrativismo e domesticação, mostrando como a visão excludente entre essas práticas prejudicou o aproveitamento pleno da castanha-do-pará e reforçou desigualdades socioeconômicas nas regiões produtoras. A pesquisa combina levantamento documental, histórico e técnico, fazendo uso extensivo de fontes primárias e secundárias, e oferecendo um panorama abrangente da cadeia produtiva da castanha ao longo dos séculos.

1. Introdução: castanha como símbolo da Amazônia

Desde os relatos dos primeiros viajantes europeus, a castanha-do-pará é citada como um dos produtos mais emblemáticos da floresta amazônica. Utilizada tanto na alimentação quanto em rituais e instrumentos, a amêndoa ganhou destaque internacional por seu sabor e valor nutricional. No entanto, o Brasil nunca conseguiu estruturar plenamente uma cadeia produtiva moderna para esse recurso, deixando de aproveitar suas potencialidades econômicas e sociais.

2. O extrativismo como herança colonial

A exploração da castanha seguiu, historicamente, o modelo predatório herdado do sistema de aviamento, onde o extrator se tornava dependente do aviador (comerciante), preso a um sistema de dívidas e exploração. Essa forma de organização produtiva, reforçada por políticas de ocupação territorial e ausência de investimentos públicos no extrativismo, dificultou a adoção de tecnologias que poderiam melhorar a produtividade e as condições de trabalho.

3. Aspectos botânicos e ecológicos

A castanheira (Bertholletia excelsa) é uma espécie nativa da floresta amazônica, com grande valor ecológico e econômico. Sua frutificação é lenta (até 20 anos), depende de polinização cruzada feita por abelhas nativas e sua dispersão natural é limitada. O ouriço, fruto lenhoso que armazena de 10 a 25 castanhas, só se abre com o impacto da queda, dificultando a coleta mecanizada. Essas características dificultam o cultivo em larga escala, o que mantém a dependência dos castanhais nativos.

4. A trajetória comercial

Desde o século XVIII, a castanha-do-pará foi exportada principalmente para a Europa e Estados Unidos. No início do século XX, cidades como Belém e Manaus se tornaram polos de beneficiamento e exportação. A cadeia comercial, no entanto, manteve-se altamente concentrada, beneficiando grandes comerciantes e industriais, enquanto os extratores seguiam marginalizados. A concorrência boliviana, especialmente nas últimas décadas, desestabilizou ainda mais o mercado brasileiro.

5. O declínio no sudeste do Pará

A partir da década de 1970, políticas de incentivo à pecuária e à mineração contribuíram para o desmatamento de grandes áreas de castanhais no sudeste do Pará, especialmente em Marabá. A urbanização desordenada, aliada à fragilidade da regulação ambiental, resultou em verdadeiro "cemitério das castanheiras", fenômeno que simboliza o abandono da atividade extrativista tradicional.

6. Tentativas de domesticação e cultivo racional

Apesar de experiências de cultivo desde o século XIX (inclusive por ingleses na Malásia), foi só a partir dos anos 1960 que o Brasil, via instituições como o IPEAN e a EMBRAPA, conseguiu desenvolver métodos viáveis de domesticação da castanheira. O cultivo racional mostrou-se possível, inclusive com enxertia para acelerar a frutificação, mas encontrou resistência de extrativistas, ambientalistas e setores da indústria.

7. A industrialização limitada

Embora a castanha tenha elevado teor de lipídios e selênio, seu aproveitamento ainda é restrito à amêndoa in natura. Setores como cosméticos passaram a incorporar o óleo da castanha, mas a indústria alimentícia brasileira explorou pouco suas potencialidades. A Conferência Nacional da Castanha-do-Pará (1967) e estudos do CTPTA apontaram caminhos para ampliar seu uso, mas faltaram políticas públicas de fomento e incentivos econômicos.

8. As tensões entre extrativismo e cultivo

O autor argumenta que a dicotomia entre extrativismo e cultivo impediu avanços na cadeia produtiva. Em vez de adotar um modelo complementar, optou-se por uma visão excludente: ou se extrai da floresta ou se planta. Isso prejudicou o desenvolvimento tanto da atividade tradicional quanto da modernização, criando incertezas sobre o futuro do produto no mercado global.

9. Alternativas futuras e recomendações

A dissertação sugere que o caminho para o fortalecimento da cadeia produtiva da castanha-do-pará está na integração entre extrativismo com manejo sustentável e o cultivo racional em áreas já degradadas. Além disso, propõe:

·         Fortalecimento de cooperativas e associações;

·         Investimento em tecnologias de processamento e armazenamento;

·         Campanhas de consumo interno;

·         Reformulação de políticas públicas;

·         Ampliação de mercados, inclusive com certificações de origem e orgânico.

Conclusão

A castanha-do-pará representa não apenas uma fonte de renda para comunidades amazônicas, mas um símbolo da tensão entre tradição e modernização no uso dos recursos naturais. O autor defende que a superação dessa dicotomia, com base em políticas públicas bem estruturadas e valorização do conhecimento tradicional, pode garantir um futuro promissor para o produto, promovendo ao mesmo tempo conservação ambiental e desenvolvimento social.

Referência

ALMEIDA, J. J. Do extrativismo à domesticação: as possibilidades da castanha-do-pará. 4 mar. 2015.

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O artigo científico intitulado “Effect of Brazil Nuts on Selenium Status, Blood Lipids, and Biomarkers of Oxidative Stress and Inflammation: A Systematic Review and Meta-Analysis of Randomized Clinical Trials”, publicado na revista Antioxidants em 2022, é uma revisão sistemática com meta-análise que investiga os efeitos do consumo de castanha-do-brasil sobre biomarcadores relacionados à saúde metabólica.

Realizado por uma equipe internacional de pesquisadores liderados por Justyna Godos e Giuseppe Grosso, o estudo busca reunir evidências de ensaios clínicos randomizados para avaliar se o consumo da castanha melhora o status de selênio no organismo, a atividade antioxidante (especialmente via glutationa peroxidase), os lipídios sanguíneos e marcadores inflamatórios. Trata-se de uma abordagem robusta para esclarecer os potenciais benefícios dessa oleaginosa típica da Amazônia na prevenção de doenças crônicas não transmissíveis.

1. Objetivo

O artigo tem como foco principal avaliar se o consumo de castanha-do-brasil influencia positivamente:

·         Os níveis de selênio no sangue;

·         A atividade da enzima glutationa peroxidase (GPx);

·         Os lipídios sanguíneos (colesterol total, LDL, HDL);

·         Os biomarcadores de estresse oxidativo e inflamação (ex: CRP, IL-6, TNF-α).

2. Metodologia

·         Revisão sistemática e meta-análise realizada conforme o protocolo PRISMA.

·         Base de dados: PubMed, EMBASE e Web of Science.

·         Critérios PICOS: estudos clínicos randomizados com intervenção dietética envolvendo castanha-do-brasil e seus efeitos nos biomarcadores listados.

·         Foram incluídos 8 estudos (6 com design paralelo, 2 com design cruzado), envolvendo vários grupos populacionais: adolescentes obesos, adultos saudáveis, idosos com comprometimento cognitivo leve, indivíduos hipertensos, dislipidêmicos e em risco de câncer colorretal.

3. Principais resultados

3.1. Efeito sobre o status de selênio

Resultado significativo: a castanha-do-brasil aumentou expressivamente os níveis de selênio no sangue.

·         SMD = 6,93 (IC 95%: 3,99 a 9,87).

·         O efeito foi consistente mesmo com diferentes valores imputados para correlações ausentes.

·         Efeito mais forte em estudos com amostras maiores, participantes mais velhos e estudos mais recentes.

·         Alta heterogeneidade (I² > 95%).

3.2. Efeito sobre a atividade da glutationa peroxidase (GPx)

Resultado positivo e significativo:

·         SMD = 0,53 (IC 95%: 0,07 a 0,99).

·         Quando se excluiu um estudo com design cruzado, o efeito aumentou para SMD = 0,70.

·         A atividade de GPx aumentou significativamente em 3 dos 4 estudos paralelos.

3.3. Efeito sobre o perfil lipídico

Sem efeito significativo nos níveis de:

·         Colesterol total: SMD = −0,22;

·         LDL-c: SMD = −0,15;

·         HDL-c: SMD = −0,04.

Somente um estudo apontou melhora no perfil lipídico com castanha (adolescentes obesos), os demais não observaram diferenças relevantes.

3.4. Estresse oxidativo e inflamação

Estresse oxidativo:

·         Redução de LDL oxidado em dois estudos.

·         Sem alterações significativas nos níveis de MDA e 8-epi-PGF2α.

Inflamação:

·         Três estudos avaliaram proteína C reativa (CRP), sem efeito significativo.

4. Discussão

·         A castanha-do-brasil é fonte rica de selênio, nutriente essencial para a formação de selenoproteínas antioxidantes, principalmente a glutationa peroxidase (GPx).

·         A melhora na atividade de GPx indica que o alimento pode reforçar as defesas antioxidantes do organismo.

·         Entretanto, não foi demonstrado efeito direto sobre os níveis lipídicos ou marcadores inflamatórios.

·         O alto teor de selênio das castanhas usadas nos estudos (até 300 µg/dia) está acima da ingestão recomendada (50 µg/dia), mas dentro do limite seguro (400 µg/dia).

5. Conclusões

A castanha-do-brasil:

·         Melhora significativamente o status de selênio;

·         Aumenta a atividade antioxidante via GPx;

·         Não demonstra efeito relevante sobre colesterol ou inflamação, de acordo com os estudos disponíveis.

A pesquisa recomenda novos estudos com maior rigor metodológico e controle de variáveis, para explorar melhor o potencial cardioprotetor e anti-inflamatório da castanha-do-brasil.

Referência

GODOS, J. et al. Effect of Brazil Nuts on Selenium Status, Blood Lipids, and Biomarkers of Oxidative Stress and Inflammation: A Systematic Review and Meta-Analysis of Randomized Clinical Trials. Antioxidants, Basel, v. 11, n. 403, p. 1–14, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.3390/antiox11020403. Acesso em: 11 abr. 2025.

 

 

O artigo “Aspectos da cadeia produtiva da castanha-do-brasil no estado do Acre, Brasil”, publicado no Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi – Ciências Naturais em 2014, é uma nota de pesquisa assinada por Márcio Muniz Albano Bayma, Fernando Wagner Malavazi, Claudenor Pinho de Sá, Fernanda Lopes Fonseca, Edivaldo Pinheiro Andrade e Lúcia Helena de Oliveira Wadt. O estudo descreve as principais mudanças ocorridas na cadeia produtiva da castanha-do-brasil no Acre ao longo da década de 2000, com foco nos efeitos de políticas públicas e da organização social em cooperativas.

Com base em dados secundários e relatos de atores envolvidos na cadeia, os autores analisam como o estado reestruturou sua produção, aumentou sua capacidade de beneficiamento e reorganizou os fluxos comerciais, tanto para o mercado interno quanto externo. A pesquisa destaca o protagonismo da COOPERACRE, o fortalecimento de outras cooperativas e o avanço no beneficiamento como estratégias centrais para agregar valor e gerar renda para os extrativistas locais.

1. Contexto e importância da castanha-do-brasil

A castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa) é um dos principais produtos florestais não madeireiros da Amazônia. Além do valor ecológico, ela representa importante fonte de renda para mais de 55 mil pessoas na região. No Acre, sua exploração é concentrada em áreas de floresta nativa, principalmente nas regionais do Alto e Baixo Acre.

A cadeia produtiva da castanha no estado ganhou destaque por passar por profundas transformações a partir dos anos 2000, impulsionadas pela valorização dos PFNMs (produtos florestais não madeireiros) como vetores de conservação e geração de renda.

2. Produção no estado do Acre

·         O Acre se alternou entre os primeiros colocados na produção nacional entre 1990 e 2012.

·         A produção cresceu significativamente após 2005, com aumento de 90% em relação ao ano anterior, devido à implementação de políticas públicas e de estruturas de beneficiamento.

3. Políticas públicas e mudanças estruturantes

As principais mudanças na cadeia ocorreram graças a:

·         Implantação de usinas de beneficiamento ligadas às cooperativas CAEX e CAPEB;

·         Criação da COOPERACRE, central de cooperativas extrativistas que articula mais de 20 associações e cooperativas;

·         Instituição da Portaria 257 da SEFAZ-AC, que tributou a saída de castanha para outros estados;

·         Capacitação em boas práticas de produção.

Essas medidas permitiram que o estado passasse de exportador de matéria-prima bruta para processador parcial da castanha, agregando valor ao produto final.

4. Estrutura da cadeia produtiva

A cadeia envolve:

·         Fornecedores de insumos;

·         Extrativistas;

·         Intermediários e associações;

·         Cooperativas e usinas de beneficiamento;

·         Exportadores/importadores e mercado nacional.

Os principais municípios produtores em 2012 foram Brasileia, Xapuri, Rio Branco e Sena Madureira.

5. Fluxos de comercialização

5.1. Exportação

·         Grande parte da castanha é exportada com casca para indústrias bolivianas (em Cobija e Riberalta), que processam e redistribuem mundialmente.

·         O fluxo boliviano substituiu o antigo fluxo com destino ao Pará e Amazonas.

·         A proximidade e a infraestrutura tecnológica da Bolívia favoreceram esse redirecionamento.

5.2. Mercado interno

·         Atualmente, 5 indústrias no Acre processam 68% da produção local.

·         Os produtos abastecem o mercado interno (Sul e Sudeste) e segmentos como alimentos e cosméticos.

5.3. Intermediação

·         O papel do intermediário tem mudado: de figura exploratória passou, em alguns casos, a ser extrativista mais estruturado da própria comunidade.

·         Ainda há práticas como compra antecipada com valores fixados na negociação, o que pode limitar os ganhos dos extrativistas.

6. Papel das associações e cooperativas

·         Associações formadas por agricultores familiares e extrativistas atuam como base da cadeia, integrando-se às cooperativas.

·         As cooperativas oferecem benefícios como:

o   Crédito antecipado;

o   Preço com ágio para associados adimplentes;

o   Transporte e garantia de compra da produção.

o   A COOPERACRE é o principal agente organizacional e industrial, com duas usinas ativas (em Brasileia e Xapuri) e uma terceira em construção em Rio Branco.

7. Beneficiamento e agregação de valor

A industrialização permite a obtenção de diversos produtos:

·         Castanha com casca seca;

·         Amêndoas com ou sem pele;

·         Farinha desengordurada (rica em proteínas, contendo excelsina como proteína principal);

·         Óleo de castanha (usado em alimentos e cosméticos);

·         Produtos industrializados (biscoitos, castanha fatiada e salgada).

A empresa Miragina Ltda. é citada como exemplo de agroindústria familiar que agrega valor ao produto.

8. Evolução do mercado

·         Exportações com casca passaram a ocorrer com regularidade após 2004.

·         Mercado nacional da amêndoa cresceu substancialmente: aumento de 348% no volume comercializado em 2011 e 661% no valor faturado, em comparação a 2010.

·         A flutuação do câmbio e restrições internacionais podem ter incentivado a priorização do mercado interno.

9. Considerações finais

O Acre demonstrou que ações coordenadas entre governo e sociedade civil organizada são eficazes para fortalecer cadeias produtivas sustentáveis. A formação de uma central de cooperativas, somada a investimentos em processamento e tributação estratégica, permitiu agregar valor à castanha-do-brasil e manter maior parcela da riqueza no território.

Apesar dos avanços, ainda são necessárias políticas para:

·         Melhorar a capacidade industrial;

·         Diversificar o uso da castanha;

·         Empoderar os extrativistas com remuneração justa e acesso ao mercado.

 

Referência

BAYMA, Márcio Muniz Albano et al. Aspectos da cadeia produtiva da castanha-do-brasil no estado do Acre, Brasil. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Naturais, Belém, v. 9, n. 2, p. 417-426, maio-ago. 2014. Disponível em: https://doi.org/10.46357/bcnaturais.v9i2.1626. Acesso em: 11 abr. 2025.

 

 

 

O artigo “Potencial do Extrativismo da Castanha-do-Pará na Geração de Renda em Comunidades da Mesorregião Baixo Amazonas, Pará”, publicado na revista Floresta e Ambiente (v. 20, n. 4, 2013), é de autoria de Adriano Araújo Silva, Maria Kelliane Valentim Santos, João Ricardo Vasconcelos Gama, Rommel Noce e Sandro Leão. O estudo avalia a viabilidade econômica da atividade extrativista da castanha-do-pará em três municípios paraenses — Almeirim, Óbidos e Oriximiná — com base em indicadores como custo de extração, receita líquida, remuneração da mão de obra familiar (RMOF) e renda do trabalho familiar (RTF).

Os resultados mostram que, apesar das dificuldades estruturais e de mercado, o extrativismo da castanha pode ser financeiramente viável, gerando renda compatível com o custo de oportunidade da região, principalmente quando realizado com mão de obra familiar. O estudo reforça o papel socioeconômico e ambiental da castanha-do-pará para comunidades tradicionais amazônicas.

1. Introdução

A castanha-do-pará (Bertholletia excelsa) é um dos produtos florestais não madeireiros mais relevantes da Amazônia, com forte valor econômico, social e ambiental. A coleta da castanha sustenta milhares de famílias na região e promove a conservação da floresta.

Contudo, há controvérsias quanto à viabilidade econômica do extrativismo: alguns autores o consideram alternativa sustentável, enquanto outros o veem como atividade de produtividade decrescente e baixa rentabilidade. O estudo busca esclarecer esse debate a partir da realidade da região do Baixo Amazonas.

2. Objetivo

Avaliar a viabilidade econômica da extração da castanha-do-pará nos municípios de Oriximiná, Óbidos e Almeirim, a partir de dados coletados com extrativistas e atravessadores, analisando o custo da atividade, a renda gerada, e o papel da mão de obra familiar no processo.

3. Metodologia

·         Amostra: 40 extrativistas e 9 atravessadores.

·         Instrumento: Questionários semiestruturados, com amostragem não probabilística (técnica bola de neve).

·         Indicadores econômicos analisados:

o   Receita líquida (RL);

o   Remuneração da mão de obra familiar (RMOF);

o   Renda do trabalho familiar (RTF);

·         Foram considerados os custos com transporte, ferramentas, roupas, munição, e utensílios pessoais usados na coleta.

4. Principais resultados

4.1 Mão de obra e perfil dos extrativistas

·         A coleta é majoritariamente realizada com mão de obra familiar.

·         Muitos coletores também trabalham na agricultura familiar ou em outras ocupações.

·         A maioria dos entrevistados pratica o extrativismo como atividade complementar de renda, não exclusiva.

4.2 Coleta e transporte

·         A distância dos castanhais varia entre 1,5 e 13 km.

·         Em Oriximiná, o transporte é facilitado por uma cooperativa quilombola, que ajuda com caminhões e logística.

·         Em Óbidos e Almeirim, o transporte é geralmente manual ou com embarcações de pequeno porte (canoas com motor de rabeta).

·         A coleta e o transporte são rústicos e manuais, gerando baixo rendimento.

4.3 Comercialização e papel dos atravessadores

·         O atravessador é o principal agente de comercialização em todos os municípios, comprando diretamente nas comunidades.

·         A maioria dos coletores vende a castanha durante a safra, quando os preços estão mais baixos.

·         A cooperativa de Oriximiná compra mais de 1/3 da produção local, pagando à vista e oferecendo apoio com transporte e armazenamento.

4.4 Dificuldades

·         Falta de apoio financeiro/governamental;

·         Ausência de políticas públicas voltadas ao extrativismo;

·         Dependência de atravessadores;

·         Preço de venda geralmente abaixo do potencial de mercado;

·         Armazenamento precário das amêndoas.

4.5 Potencialidades

·         Proximidade dos castanhais (em alguns municípios);

·         Experiências de organização coletiva bem-sucedidas (como a cooperativa quilombola);

·         Demanda contínua por castanha;

·         Realização de treinamentos em boas práticas de coleta em Oriximiná.

5. Análise econômica

·         A principal despesa é com mão de obra de coleta, representando até 68,13% do custo total.

·         Outros custos relevantes: transporte (até 12,86%) e quebra dos ouriços.

·         Custos totais:

o   Almeirim: R$ 3.324,29

o   Óbidos: R$ 1.494,80

o   Oriximiná: R$ 1.229,80

Receita líquida e RMOF

·         A receita líquida foi positiva nos três municípios:

o   Oriximiná: R$ 225,77

o   Óbidos: R$ 167,04

o   Almeirim: R$ 368,72

·         A RMOF foi próxima ou superior ao custo de oportunidade:

o   Oriximiná: R$ 26,47

o   Óbidos: R$ 23,98

o   Almeirim: R$ 24,69

Contribuição na renda familiar

·         A castanha contribui com 15 a 18% da renda familiar dos coletores.

·         Outras fontes incluem: agricultura, pesca, artesanato, pensões e benefícios sociais.

·         A agricultura familiar ainda é a base da segurança alimentar.

Conclusões

O estudo conclui que o extrativismo da castanha-do-pará é economicamente viável, mesmo com estrutura rudimentar, quando realizado com mão de obra familiar e apoio local. A atividade gera renda adicional, contribui para o sustento das famílias e promove a conservação da floresta. No entanto, melhorias em políticas públicas, infraestrutura, organização produtiva e acesso ao mercado são necessárias para ampliar a renda e a autonomia dos extrativistas.

Referência

SILVEIRA, A. A. et al. Potencial do Extrativismo da Castanha-do-Pará na Geração de Renda em Comunidades da Mesorregião Baixo Amazonas, Pará. Floresta e Ambiente, 2013.

 

 

 

O artigo “O extrativismo como elemento de desenvolvimento e sustentabilidade na Amazônia: um estudo a partir das comunidades coletoras de castanha-do-brasil em Tefé, AM”, publicado na Revista Destaques Acadêmicos (v. 11, n. 2, 2019), foi escrito por Lindomar De Jesus de Sousa Silva (Embrapa), Gilmar A. Meneghetti, José O. C. Pinheiro, Endrio M. dos Santos e Daiana M. Parintins. O estudo investiga, sob uma abordagem socioeconômica, os fatores que mantêm comunidades extrativistas em situação de vulnerabilidade e analisa a coleta de castanha-do-brasil como possível caminho para o desenvolvimento sustentável local.

A pesquisa foi conduzida em quatro comunidades do município de Tefé (AM): Caiambé, Santo Isidoro, Justiça e Marajó, combinando métodos qualitativos e quantitativos com entrevistas a 31 extrativistas. O artigo destaca o potencial da castanha-do-brasil como instrumento de desenvolvimento, desde que sejam superadas barreiras como a frágil organização social, o domínio de atravessadores sobre a comercialização e o baixo acesso a políticas públicas e tecnologias.

1. Contextualização histórica

A coleta de castanha-do-brasil remonta ao período pré-colonial, quando povos nativos a utilizavam como alimento e insumo. Com a chegada dos europeus, seu valor econômico aumentou, sendo exportada a partir do século XVII. A castanha integrou ciclos econômicos amazônicos, sendo especialmente valorizada no século XX, quando se consolidou como principal produto extrativista da região.

2. Objetivo

Analisar os fatores socioeconômicos que explicam a permanência das comunidades coletoras de castanha-do-brasil em situação de pobreza e apontar caminhos para transformar o extrativismo em motor de desenvolvimento local.

3. Metodologia

·         Abordagem mista (quantitativa e qualitativa);

·         Aplicação de questionários semiestruturados a 20% dos extrativistas de quatro comunidades (31 pessoas);

·         Classificação como estudo exploratório, pela escassez de estudos prévios sobre a dinâmica local;

·         Análise estatística simples e interpretação dos dados com base em referenciais sobre extrativismo e desenvolvimento rural.

4. Principais achados

4.1 Estrutura familiar e sucessão

·         89% dos extrativistas sucederam os pais na atividade, revelando tradição familiar na coleta da castanha.

·         A redução do número de membros por família e o envelhecimento dos coletores indicam diminuição da força de trabalho.

·         Jovens estão migrando para centros urbanos, não se sentem atraídos pela atividade devido à baixa rentabilidade e condições precárias.

4.2 Condições de trabalho e tecnologia

·         O trabalho é manual e rudimentar: uso de facões, cestos de cipó e ausência de inovações tecnológicas.

·         A única mudança recente foi o uso de motores rabetas para deslocamento fluvial.

·         A coleta continua exigente fisicamente e insalubre, o que afasta os mais jovens.

4.3 Produção local

·         As quatro comunidades estudadas (Caiambé, Marajó, Jutica e Santo Isidoro) responderam por 19,4% da produção municipal de castanha de Tefé em 2016 (139,68 t de 720 t totais).

·         As áreas são reconhecidas por sua alta produtividade histórica, mas sem industrialização local.

4.4 Comercialização e atravessadores

·         71% dos extrativistas vendem na própria comunidade, o restante no porto de Tefé.

·         45% recorrem a adiantamentos com comerciantes, que determinam preços e garantem o controle sobre a produção.

·         A dependência dos atravessadores mantém os extrativistas em situação de desvantagem comercial.

4.5 Renda e pluriatividade

·         A renda bruta anual média dos extrativistas gira em torno de R$ 15 mil, somando agricultura, extrativismo e programas sociais (como Bolsa Família e aposentadoria).

·         A renda das atividades extrativistas puras representa menos da metade da renda familiar total em muitos casos.

·         A pluriatividade é essencial para garantir a sobrevivência das famílias.

4.6 Organização social

·         As associações e sindicatos existentes são pouco eficazes no fortalecimento da atividade.

·         A maioria dos extrativistas não participa de organizações ou o faz apenas para garantir benefícios específicos (ex: seguro-defeso).

·         Falta uma organização social que represente coletivamente os interesses da produção, acesso a políticas públicas e comercialização.

4.7 Educação e acesso a políticas públicas

·         Alta taxa de analfabetismo (17%) e baixa escolaridade geral: apenas 3% concluíram o ensino médio.

·         A educação descontextualizada da realidade rural afasta os jovens do campo e enfraquece a capacidade de inovação.

·         A maioria das áreas de coleta não possui titulação fundiária, o que impede o acesso a crédito e programas governamentais.

·         Assistência técnica é quase inexistente, e a estagnação tecnológica compromete a competitividade do produto.

5. Considerações finais

O extrativismo da castanha-do-brasil tem alto potencial socioeconômico e ambiental, mas não se traduz em bem-estar para as comunidades extrativistas. O modelo atual de comercialização, baseado na dependência de atravessadores e na ausência de organização coletiva, perpetua a pobreza.

O artigo defende que é necessário:

·         Incentivar novas formas de organização social;

·         Promover agregação de valor no território (ex: beneficiamento local);

·         Garantir acesso à terra e a políticas públicas efetivas;

·         Atrair os jovens por meio de melhores condições de trabalho e renda.

Apenas com essas transformações será possível reverter o ciclo histórico de exploração e fazer com que parte significativa da riqueza gerada na floresta permaneça na floresta.

Referência

DE SOUSA SILVA, L. D. J. et al. O EXTRATIVISMO COMO ELEMENTO DE DESENVOLVIMENTO E SUSTENTABILIDADE NA AMAZÔNIA: UM ESTUDO A PARTIR DAS COMUNIDADES COLETORAS DE CASTANHA-DO-BRASIL EM TEFÉ, AM. Revista Destaques Acadêmicos, v. 11, n. 2, 30 ago. 2019.

 

 

 

A tese de doutorado intitulada “O extrativismo da castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa Blonp.) e a sobrevivência de comunidades na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Amapá, em Manicoré, Amazonas”, defendida por Luciane Maria da Silva no Programa de Pós-Graduação em Ciências de Florestas Tropicais do INPA, analisa os aspectos econômicos, sociais e produtivos do extrativismo da castanha-do-brasil na região sul do Amazonas.

O trabalho combina teoria econômica com uma abordagem socioambiental, buscando compreender como o extrativismo se insere na lógica de mercado, ao mesmo tempo em que sustenta comunidades tradicionais em contextos de vulnerabilidade. A autora utiliza métodos quantitativos e qualitativos para estimar funções de oferta e demanda, avaliar elasticidade-preço e mapear a renda familiar, considerando a realidade de comunidades agroextrativistas da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Rio Amapá.

1. Contexto

O extrativismo da castanha é historicamente relevante para comunidades amazônicas, mas sua viabilidade econômica e seu papel como alternativa de desenvolvimento sustentável ainda são debatidos. A região estudada, no município de Manicoré (AM), abriga diversas comunidades que dependem da castanha para subsistência.

2. Objetivo

Analisar os modelos socioeconômicos e produtivos de comunidades extrativistas da castanha-do-brasil na RDS do Rio Amapá, com foco em:

·         Dinâmica de mercado;

·         Oferta e demanda do produto;

·         Composição da renda familiar;

·         Configuração produtiva do agroextrativismo local.

3. Metodologia

·         Estimativas econométricas (funções de oferta e demanda) com base no Método dos Mínimos Quadrados Ordinários (MQO);

·         Análise de dados secundários de 1994 a 2012 (IBGE, IPEA, SFB, etc.);

·         Pesquisas de campo com famílias extrativistas;

·         Cálculo da elasticidade-preço da oferta e da demanda;

·         Diagnóstico socioeconômico em dez comunidades da RDS do Rio Amapá.

4. Estrutura da tese

Organizada em quatro capítulos:

1.    O mercado da castanha-do-brasil na Amazônia brasileira;

2.    Produção e elasticidade-preço da castanha no sul da Amazônia;

3.    Subsistência de comunidades agroextrativistas;

4.    Produção agroextrativista e desenvolvimento econômico local.

5. Principais resultados

5.1. Mercado e estrutura

·         O mercado da castanha-do-brasil se aproxima de concorrência perfeita, mas em algumas regiões há monopsônio, com poucos compradores controlando os preços.

·         Os extrativistas são tomadores de preço, com pouca capacidade de negociação individual.

5.2. Oferta e demanda

·         A oferta é inelástica ao preço (Ɛ = -0,50), ou seja, aumentos no preço não resultam em aumentos proporcionais da produção.

·         A demanda excede a produção disponível, indicando desequilíbrio de mercado.

·         A produção não acompanha o crescimento da demanda, revelando limitação ecológica e de escala.

5.3. Elasticidade-preço

·         A elasticidade da demanda também foi analisada e mostrou-se consistente com o padrão de bens essenciais.

·         Os modelos demonstram que a produção extrativa não responde com agilidade a estímulos econômicos devido à sazonalidade e ao limite ecológico da espécie.

5.4. Produção familiar e renda

·         A renda das famílias agroextrativistas provém de múltiplas fontes: castanha, agricultura, programas sociais (como Bolsa Família).

·         A castanha é o principal componente de renda durante o período chuvoso, mas sozinha não garante segurança econômica.

·         A organização cooperativa (COVEMA) permite agregação de valor e distribuição de dividendos aos cooperados (valores entre R$ 5,00 e R$ 7,00 por kg de castanha repassado a eles, com revenda chegando a R$ 25,00/kg da amêndoa beneficiada).

5.5. Limitações e desafios

·         Falta de políticas públicas voltadas à regulação e incentivo do extrativismo;

·         Carência de infraestrutura, assistência técnica e informação de mercado;

·         A lógica da economia extrativa ainda é invisível ao sistema econômico tradicional;

·         Plantios de castanheira ainda não demonstram viabilidade econômica para produção de amêndoas;

·         A comercialização cooperada é um diferencial positivo, mas ainda restrita a poucos grupos organizados.

5.6. Contribuições teóricas

·         O estudo incorpora conceitos como externalidades positivas, falhas de mercado, economia solidária e desenvolvimento local sustentável.

·         A castanha é vista como produto-chave para conciliar conservação e desenvolvimento, mas isso depende de novos arranjos institucionais e mercadológicos.

6. Considerações finais

O extrativismo da castanha-do-brasil, apesar de sua importância ambiental, social e econômica, opera à margem da lógica de mercado tradicional. A atividade, mesmo em regiões com histórico de organização como a RDS do Rio Amapá, ainda enfrenta grandes obstáculos para se consolidar como motor de desenvolvimento sustentável.

A autora defende que novas políticas públicas, inovação social e acesso ao mercado justo são fundamentais para romper com ciclos históricos de exclusão e transformar o extrativismo em instrumento efetivo de melhoria da qualidade de vida das comunidades amazônicas.

Referência

SILVA, Luciane Maria da. O extrativismo da castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa Blonp.) e a sobrevivência de comunidades na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Amapá, em Manicoré, Amazonas. 2015. 156 f. Tese (Doutorado em Ciências de Florestas Tropicais) — Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), Manaus, 2015.

 

 

 

O artigo “Meta-análise do teor de selênio em castanha-do-brasil”, publicado na revista Brazilian Journal of Food Technology (v. 11, n. 1, p. 54–62, 2008), foi elaborado por pesquisadoras da Embrapa Agroindústria de Alimentos, incluindo Sidinéa Cordeiro de Freitas, Elisabeth Borges Gonçalves, Rosemar Antoniassi, Ilana Felberg e Silvana Pedroso de Oliveira. O estudo aplica a metodologia de meta-análise para compilar e analisar a variação do teor de selênio (Se) em castanhas-do-brasil, com base em dados de diversas publicações científicas.

O trabalho visa avaliar a amplitude dessa variação, os riscos associados ao consumo excessivo ou insuficiente de selênio por meio da castanha, e a necessidade de monitoramento do seu teor para fins de segurança alimentar e rotulagem nutricional. A pesquisa é inédita no campo da tecnologia de alimentos ao aplicar estatísticas robustas sobre um alimento natural de variabilidade elevada.

1. Introdução

O selênio é um micronutriente essencial com funções antioxidantes e papel na regulação de hormônios tireoidianos. Sua ingestão dietética recomendada (IDR) é de 55 µg/dia para adultos, enquanto o limite superior tolerável (UL) é de 400 µg/dia. A castanha-do-brasil é considerada uma das fontes naturais mais ricas de selênio, mas apresenta alta variação nos teores do mineral, conforme reportado na literatura — entre 0,003 e 51,2 mg/100g, uma amplitude de 1:17.000.

Dado esse cenário, a meta-análise buscou responder: qual o risco de ingestão insuficiente ou excessiva de selênio ao consumir uma castanha-do-brasil?

2. Metodologia

Revisão e análise de artigos publicados entre 1978 e 2006;

Os dados foram transformados estatisticamente (log10, raiz quadrada, arco seno da raiz quadrada) para adequação à normalidade;

Aplicação do teste T-Student para comparação de médias e F de Snedecor para comparação de variâncias;

Estimativas probabilísticas para identificar a chance de uma castanha ter teor de selênio abaixo da IDR (55 µg) ou acima do UL (400 µg).

3. Resultados

3.1 Teores individuais e variabilidade

Em 40 castanhas analisadas individualmente por Freitas et al. (2004), os teores variaram de 0,18 a 32,08 mg/100g, com média de 5,20 mg/100g e desvio padrão de 7,48 mg/100g.

Quando medidas foram feitas em porções homogeneizadas, a variabilidade foi significativamente menor (ex.: média 3,32 mg/100g, DP 0,53).

A distribuição logarítmica (log10) dos teores de selênio mostrou-se mais adequada para análise estatística, aderindo à normalidade (teste de Kolmogorov-Smirnov com p = 0,3187).

3.2 Comparação entre estudos

A comparação entre diferentes publicações revelou diferenças estatisticamente significativas entre os teores médios e as variâncias:

Castanhas do Pará, Acre, Rondônia, Belém, Manaus e Reino Unido apresentaram padrões distintos;

As diferenças são atribuídas à procedência geográfica, ao teor de Se no solo, à parte da planta analisada, ao método de amostragem e ao tipo de processamento (com ou sem casca, a granel ou embaladas);

Coeficientes de variação (CV) variaram de 16% a 180%, indicando alta dispersão.

3.3 Riscos de consumo

Com base na média de 4,78 g/castanha:

5,24% das castanhas poderiam conter >400 µg de Se, representando risco de selenose;

25,53% teriam <55 µg de Se, não atingindo a IDR se a castanha fosse a única fonte de selênio;

Isso significa que uma única castanha não garante aporte ideal e pode, em casos raros, representar risco de excesso.

3.4 Importância da forma química do selênio

A maior parte do Se na castanha está na forma de seleno-metionina e seleno-cisteína (orgânicas), que são altamente biodisponíveis e menos tóxicas do que as formas inorgânicas (selenito e selenato);

A biodisponibilidade do Se na castanha pode chegar a 90%, segundo a OMS (1998).

4. Conclusões

A castanha-do-brasil apresenta grande potencial como fonte de selênio, mas sua variabilidade natural é muito alta;

A meta-análise foi útil para sintetizar dados dispersos e reforçar a necessidade de monitoramento contínuo dos teores de selênio;

Alegações nutricionais e recomendações de consumo devem considerar essa variabilidade;

Sugere-se cautela quanto à rotulagem e à promoção do consumo exagerado, especialmente em produtos industrializados à base de castanha.

Referência

FREITAS, S. C. de et al. Meta-análise do teor de selênio em castanha-do-brasil. Brazilian Journal of Food Technology, Campinas, v. 11, n. 1, p. 54–62, jan./mar. 2008.

 

 

 

O artigo “O contexto da cadeia produtiva da castanha-do-Brasil no período de 2017 a 2021”, publicado na Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana (v. 21, n. 8, p. 9218–9230, 2023), é assinado por Lucas Silva Peixoto, Clistiane Santos Santana, Carolina Lilibeth Carvalho de Pinho, Lairy Silva Coutinho, Geovana Rocha Plácido, Osvaldo Resende, Marcos Vinicius Hendges e Daniel Emanuel Cabral de Oliveira. O estudo tem como objetivo principal analisar os dados de produção e renda da castanha-do-brasil com base nos registros do IBGE, entre os anos de 2017 e 2021, destacando os cinco principais municípios produtores.

A pesquisa faz um levantamento quantitativo da produção e dos valores de mercado da castanha, evidenciando o papel socioeconômico da cadeia produtiva na Região Norte do Brasil. Também discute desafios estruturais, como dependência de atravessadores, oscilações no preço, impacto da pandemia e limitações na organização das cooperativas.

1. Introdução

A castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa), também conhecida como castanha-da-amazônia ou castanha-do-pará, é um produto florestal não madeireiro de alto valor socioeconômico e nutricional, amplamente extraído por comunidades tradicionais da Amazônia. Seu cultivo é totalmente orgânico, sem uso de insumos químicos.

É uma atividade reconhecida por ambientalistas por promover a manutenção da floresta em pé, sendo a base econômica de muitas famílias extrativistas na região Norte.

2. Objetivo

Analisar o cenário da cadeia produtiva da castanha-do-brasil entre 2017 e 2021, com base nos dados do IBGE, identificando os municípios com maior volume de produção, evolução do valor de mercado e principais desafios enfrentados no período.

3. Metodologia

·         Revisão narrativa com dados secundários;

·         Fonte principal: Produção da Extração Vegetal e Silvicultura (PEVS/IBGE);

·         Variáveis analisadas: quantidade produzida (t), valor da produção (R$) e preço unitário (R$/t);

·         Comparação anual de municípios produtores

4. Resultados principais

4.1 Ranking de produção por município

A análise identificou os cinco municípios líderes nacionais em produção de castanha-do-brasil por ano:

·         Humaitá (AM) liderou o ranking em todos os anos (2017 a 2021), sendo responsável por 13,59% da produção nacional em 2021.

·         Outros municípios em destaque: Óbidos (PA), Oriximiná (PA), Xapuri (AC), Sena Madureira (AC), Porto Velho (RO).

4.2 Evolução dos preços

·         O preço da tonelada apresentou crescimento de 2017 a 2019;

·         Em 2020 houve queda acentuada, reflexo direto da pandemia de Covid-19, que afetou exportações, fechamento de cooperativas e escoamento da produção.

4.3 Comercialização e circuitos de venda

·         Identificados dois circuitos de comercialização:

o   Circuito curto: venda direta ao consumidor final;

o   Circuito longo: venda via atravessadores, que compram a castanha por preços inferiores e repassam à indústria.

Exemplo: extrativistas em Oriximiná vendiam a R$ 1,10/kg, enquanto beneficiadoras pagavam R$ 2,50/kg — lucro de 59,1% para atravessadores.

5. Discussão

5.1 Importância econômica

·         A castanha é o segundo principal produto florestal da Amazônia, depois da borracha.

·         Representa parcela relevante do PIB agroextrativista dos estados do Norte.

·         Em 2021, a produção brasileira foi de 33.406 toneladas.

5.2 Desafios estruturais

·         Falta de organização produtiva e de assistência técnica;

·         Cooperativas fragilizadas e dependentes de recursos externos;

·         Incapacidade de manter produção anual contínua nas indústrias;

·         Impactos climáticos e oscilações sazonais comprometem estabilidade de preços;

·         A ausência de políticas públicas efetivas para o setor enfraquece sua competitividade.

5.3 Destaques estaduais

·         Amazonas: maior produtor nacional, mas com baixa estrutura para comercialização em comunidades remotas.

·         Acre: demonstrou avanço graças a políticas públicas e organização de cooperativas, com Xapuri subindo no ranking.

·         Rondônia: precisa fortalecer seus arranjos produtivos.

·         Pará: alternância entre alta e queda na produção em municípios como Oriximiná e Óbidos.

6. Considerações finais

O artigo conclui que a castanha-do-brasil mantém papel central na economia extrativista amazônica, sendo fundamental para o sustento de comunidades locais. No entanto, a cadeia produtiva ainda enfrenta gargalos logísticos, baixa agregação de valor local e falta de integração entre os elos da produção.

Os autores recomendam:

·         Fortalecimento de cooperativas;

·         Melhor organização dos extrativistas;

·         Estímulo à comercialização direta para evitar atravessadores;

·         Investimentos em políticas públicas estruturantes;

·         Incentivos à pesquisa e à agregação de valor nos produtos derivados da castanha.

Referência

PEIXOTO, L. S. et al. O contexto da cadeia produtiva da castanha-do-Brasil no período de 2017 a 2021. OBSERVATÓRIO DE LA ECONOMÍA LATINOAMERICANA, v. 21, n. 8, p. 9218–9230, 17 ago. 2023.

 

 

 

O trabalho técnico “Selênio em castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa)”, publicado como Comunicado Técnico nº 71 da Embrapa Agroindústria de Alimentos em 2004, é assinado por Sidinéa Cordeiro de Freitas, Rosemar Antoniassi, Ilana Felberg e Neida Moraes Silva dos Santos. O estudo apresenta uma avaliação analítica dos teores de selênio (Se) em castanhas-do-brasil coletadas na região Norte do Brasil (Belém e Manaus), destacando sua variabilidade, riscos e benefícios nutricionais.

A castanha-do-brasil é uma das fontes naturais mais ricas de selênio conhecidas, mas a heterogeneidade nos teores encontrados entre amostras individuais levanta preocupações quanto à adequação do consumo, necessidade de rotulagem e riscos de toxicidade. O trabalho reforça a importância de considerar essa variabilidade no planejamento nutricional e em políticas públicas de alimentação.

1. Introdução

A castanha-do-brasil é reconhecida por seu alto teor de óleo e minerais, sendo uma das fontes alimentares mais importantes de selênio (Se). Este micronutriente é essencial ao organismo humano por sua ação antioxidante, principalmente como componente das selenoproteínas e da glutationa peroxidase, enzima que protege contra danos oxidativos.

Segundo o Food and Nutrition Board/Institute of Medicine (EUA), a ingestão dietética recomendada (IDR) para adultos é de 55 µg de Se/dia, enquanto o limite superior tolerável (UL) é de 400 µg/dia. Acima desse valor, pode ocorrer risco de selenose (toxicidade).

2. Objetivo

Avaliar a variabilidade dos teores de selênio em castanhas-do-brasil de diferentes origens na região Norte do Brasil e discutir as implicações nutricionais e toxicológicas dessa variabilidade no consumo humano.

3. Metodologia

·         Amostras de castanhas individuais (n = 40) e misturas de castanhas oriundas de Belém e Manaus;

·         Análise realizada por espectrometria de emissão óptica com plasma induzido (ICP-OES), após digestão em forno de micro-ondas;

·         Padrão analítico seguido conforme método da AOAC International (2000).

4. Resultados e Discussão

4.1 Teores de Se em castanhas individuais

·         Variação observada: de 0,18 mg/100g a 32,08 mg/100g;

·         Média: 5,20 mg/100g;

·         Desvio padrão: 7,48 mg/100g;

·         Distribuição:

o   70% das castanhas tinham até 5 mg/100g;

o   22% entre 5 e 20 mg/100g;

o   7,5% acima de 20 mg/100g.

4.2 Comparação com outros estudos

·         Chang et al. (1995): 0,003 a 3,17 mg/100g, média de 0,306 mg/100g;

·         Secor & Lisk (1989): 0,02 a 25,3 mg/100g, média de 1,466 mg/100g;

·         Reilly (1999): média de 3,6 mg/100g, máximo de 51,2 mg/100g.

Esses resultados confirmam uma grande heterogeneidade nos teores de Se, influenciada por:

·         Nutrição da planta;

·         Tipo e quantidade de selênio no solo;

·         Origem geográfica.

4.3 Análise de amostras compostas

·         Um lote de castanhas de Belém analisado em triplicata apresentou:

o   Variação: 2,41 a 4,05 mg/100g;

o   Média: 3,4 mg/100g;

Reflete menor variabilidade em relação à análise de castanhas isoladas.

4.4 Estimativa de ingestão de Se por castanha

·         Peso médio de uma castanha: 3,42 g;

·         Com a média de 5,20 mg/100g, uma castanha conteria em média 178 µg de Se;

o   Variação estimada: de 6 µg a 1097 µg por castanha individual;

·         Potencial de superar a IDR (55 µg) e o UL (400 µg) com uma única castanha, dependendo do teor.

4.5 Riscos e precauções

·         Embora não haja registros de intoxicação por castanha no Brasil, há relatos de selenose por suplementos contendo 27,3 mg de Se por dose (NRC, 1989);

·         Sintomas de toxicidade: queda de cabelo, unhas fracas, distúrbios gastrointestinais;

·         Recomendação: consumo orientado por nutricionistas, especialmente em dietas que incluem castanha como fonte principal de Se.

5. Considerações finais

A variação nos teores de selênio está ligada ao solo e ao estado nutricional da planta. A castanha-do-brasil é uma excelente fonte de selênio, mas a sua enorme variação natural no teor do mineral exige cautela.

 A ingestão pode tanto não atingir as necessidades diárias quanto ultrapassar o limite máximo recomendado, com risco de toxicidade. O estudo enfatiza a necessidade de moderação e acompanhamento profissional, especialmente com suplementos

Os autores recomendam:

·         Padronização da rotulagem dos produtos com castanha-do-brasil;

·         Monitoramento constante da composição;

·         Educação alimentar e acompanhamento por profissionais da saúde ao utilizar a castanha como fonte de selênio.

 

 

 

O artigo “Brazil nuts: an effective way to improve selenium status”, publicado na American Journal of Clinical Nutrition em 2008, foi conduzido por Christine D. Thomson e colaboradores da Universidade de Otago (Nova Zelândia). O estudo apresenta a primeira investigação clínica em humanos sobre a eficácia da castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa) como fonte dietética de selênio, comparando seus efeitos com os de suplementos de selenometionina.

Por meio de um ensaio clínico randomizado com adultos neozelandeses com baixa ingestão de selênio, os pesquisadores avaliaram se o consumo de apenas duas castanhas por dia, contendo cerca de 53 µg de selênio, poderia aumentar os níveis plasmáticos de selênio e a atividade da enzima antioxidante glutationa peroxidase (GPx). Os resultados mostraram que a castanha-do-brasil é tão eficaz quanto o suplemento de 100 µg de selenometionina, destacando-se como uma alternativa natural viável para melhorar o status de selênio da população.

1. Introdução

O selênio é um micronutriente essencial, componente de selenoproteínas que atuam em funções antioxidantes, metabolismo de hormônios tireoidianos, sistema imunológico e fertilidade. A deficiência de selênio está relacionada a maior risco de doenças crônicas (como câncer, cardiovasculares e autoimunes).

Em regiões como a Nova Zelândia, onde os solos são pobres em selênio, a população apresenta níveis plasmáticos baixos, o que torna importante a busca por fontes alimentares eficientes. A castanha-do-brasil é o alimento natural mais rico em selênio, mas até então não havia evidências clínicas em humanos sobre sua biodisponibilidade.

2. Objetivo do estudo

Comparar a eficácia de:

·         2 castanhas-do-brasil por dia (~53 µg de selênio em média),

·         Suplemento de 100 µg de selenometionina/dia,

·         Placebo

Na melhora dos níveis de selênio no plasma e na atividade da glutationa peroxidase (GPx) em indivíduos com status marginal de selênio.

3. Metodologia

·         Amostra: 60 adultos saudáveis (18–60 anos) com baixo nível plasmático de selênio (<1,27 µmol/L), dos quais 59 completaram o estudo.

·         Intervenção: consumo diário por 12 semanas de:

o   Grupo 1: 2 castanhas-do-brasil;

o   Grupo 2: 100 µg de selenometionina;

o   Grupo 3: placebo.

·         Parâmetros avaliados: selênio plasmático e atividade da enzima GPx no plasma e sangue total, medidos em 5 pontos: início, 2, 4, 8 e 12 semanas.

4. Resultados

4.1 Selênio plasmático

Aumento de:

·         64,2% no grupo da castanha;

·         61,0% no grupo da selenometionina;

·         7,6% no grupo placebo.

A diferença foi estatisticamente significativa entre os grupos castanha/suplemento versus placebo, mas sem diferença entre castanha e selenometionina.

4.2 Atividade da GPx no plasma

Aumento de:

·         8,3% com castanha;

·         3,4% com selenometionina;

·         redução de 1,2% com placebo.

A castanha apresentou melhor resposta funcional, embora a diferença em relação à selenometionina não tenha sido estatisticamente significativa (p = 0,065).

4.3 Atividade da GPx no sangue total

Aumento de:

·         13,2% com castanha;

·         5,3% com selenometionina;

·         1,9% com placebo.

A castanha apresentou aumento significativamente maior que o suplemento (p = 0,032) e o placebo (p = 0,002).

5. Discussão

·         A castanha-do-brasil mostrou-se altamente eficaz e funcional, mesmo fornecendo menos selênio total que o suplemento. Isso sugere melhor biodisponibilidade do selênio presente naturalmente nas castanhas.

·         A forma predominante de selênio na castanha é a selenometionina, mas outras formas bioativas também podem estar presentes.

·         A variação no conteúdo de selênio nas castanhas foi significativa, indo de 20 a 84 µg por 2 unidades, dependendo da amostra.

·         O estudo sugere que mesmo 1 castanha por dia pode ser suficiente para suprir a recomendação diária de selênio para a população da Nova Zelândia.

·         Alerta-se, no entanto, que o consumo excessivo e contínuo pode levar a acúmulo de selênio, além de possíveis riscos associados à presença de bário e rádio em concentrações naturais nas castanhas.

6. Conclusão

O consumo diário de duas castanhas-do-brasil é tão eficaz quanto um suplemento de 100 µg de selenometionina para:

·         Aumentar o nível de selênio no plasma;

·         Estimular a atividade antioxidante via GPx.

Trata-se de uma alternativa natural, funcional, de baixo custo e segura, desde que consumida com moderação. A inclusão de castanhas-do-brasil na dieta pode eliminar a necessidade de suplementação ou fortificação alimentar para melhorar o status de selênio em populações deficientes.

Referência

THOMSON, C. D. et al. Brazil nuts: an effective way to improve selenium status. The American Journal of Clinical Nutrition, v. 87, n. 2, p. 379–384, 1 fev. 2008.